Ana Cristina César

Issue #
4
February 3, 2014

from "A teus pés"/ "At your feet"

Trilha sonora ao fundo: piano no bordel, vozes barganhando
uma informação difícil. Agora silêncio; silêncio eletrônico,
produzido no sintetizador que antes construiu a ameaça das
asas batendo freneticamente.
Apuro técnico.
Os canais que só existem no mapa.
O aspecto moral da experiência.
Primeiro ato da imaginação.
Suborno no bordel.
Eu tenho uma idéia.
Eu não tenho a menor idéia.
Uma frase em cada linha. Um golpe de exercício.
Memórias de Copacabana. Santa Clara às três da tarde.
Autobiographia. Não, biografia.
Mulher.
Papai Noel e os marcianos.
Billy the Kid versus Drácula.
Drácula versus Billy the Kid.
Muito sentimental.
Agora pouco sentimental.
Pensa no seu amor de hoje que sempre dura menos que o seu
amor de ontem.
Gertrude: estas são idéias bem comuns.
Apresenta a jazz-band.
Não, toca blues com ela.
Esta é a minha vida.
Atravessa a ponte.
É sempre um pouco tarde.
Não presta atenção em mim.
Olha aqueles três barcos colados imóveis no meio
           do grande rio.
Estamos em cima da hora.
Daydream.
Quem caça mais o olho um do outro?
Sou eu que admito vitória.
Ela que mora conosco então nem se fala.
Caça, caça.
E faz passos pesados subindo a escada correndo.
Outra cena da minha vida.
Um amigo velho vive em táxis.
Dentro de um táxi é que ele me diz que quer chorar mas não
           chora.
Não esqueço mais.
E a última, eu já te contei?
É assim.
Estamos parados.
Você lê sem parar, eu ouço uma canção.
Agora estamos em movimento.
Atravessando a grande ponte olhando o grande rio e os três
barcos colados imóveis no meio.
Você anda um pouco na frente.
Penso que sou mais nova do que sou.
Bem nova.
Estamos deitados.
Você acorda correndo.
Sonhei outra vez com a mesma coisa.
Estamos pensando.
Na mesma ordem de coisas.
Não, não na mesma ordem de coisas.
É domingo de manhã (não é dia útil às três da tarde).
Quando a memória está útil.
Usa.
Agora é a sua vez.
Do you believe in love…?
Então está.
Não insisto mais.

Sonorous track in the background: piano in the bordello, voices
bargaining over difficult information. Now silence; electrical silence,
produced in a synthesis that before had become a threat of
wings beating frantically.
Technical challenge.
The canals only exist on the map.
The moral aspect of experience.
First act of the imagination.
Bribery in the bordello.
I have an idea.
I don’t have any idea.
A phrase in every line. A hit of exercise.
Memories of Copacabana. Santa Clara at three p.m.
Autobiography. No, biography.
Woman.
Santa Claus and the martians.
Billy the Kid vs. Dracula.
Dracula vs. Billy the Kid.
Very sentimental.
Now less sentimental.
Think about today’s love that always lasts less than
yesterday’s love.
Gertrude: these are very common ideas.
It seems like a jazz band.
No, play blues with her.
This is my life.
It crosses the bridge.
And always a little late.
Don’t pay attention to me.
Look at those three big barges stuck in the middle
           of the big river.
We’re at the top of the hour.
Daydream.
Who hunts most for the eye of the other?
It is I who declare victory.
She who lives with us then—don’t even mention it.
Hunts, hunts.
And steps heavily as she runs up the stairs.
Another scene in my life.
An old friend lives in taxis.
Inside one taxi, he tells me that he would like to cry but doesn’t
           cry.
I can never forget it.
And here’s the latest—did I tell you?
It’s this way.
We’re stopped.
You read incessantly, I listen to a song.
Now we’re moving.
Crossing the big bridge looking at the big
river and the three stuck barges in the middle.
You walk a bit ahead.
I think I’m younger than I am.
Very young.
We’re lying down.
You wake up running.
I dreamed again about the same thing.
No, no, in the same order of things.
And it’s Sunday morning (not a week day at three
in the afternoon).
When the memory is useful,
use it.
Now it’s your turn.
Do you believe in love?
Ok, fine.
I won’t insist any more.

This is the first section of “A teus pés,” a long hybrid poem by Ana Cristina César (1952-1983);
translated from the Portuguese by Brenda and Helen Hillman. Thanks to Tiffany Higgins for offering suggestions on our translation.

<previous
next>
There is no previous item
Go back to Top Menu
There is no next item
Go back to Top Menu